DESATINOS
De quantos desatinos se faz uma loucura?
De quantas loucuras se faz uma alegria?
De quantas alegrias uma vida precisa para ser feliz?
De quanta felicidade se faz uma história
De quantas histórias se faz uma memória
De quantas memórias uma vida precisa para renascer?
De quantas vidas se faz essa viagem
Em quantas viagens embarcamos nessas paragens
Dá para viver vendo o mundo se desfazer em bobagens?
De quantos desatinos precisamos para não enlouquecer
A quantos nãos conseguimos sobreviver
Dá para viver sem o amor fazer acontecer?
Alda M S Santos
LOUCURAS
A loucura é o tempero da vida
A pimenta que dá o toque especial ao prato principal
O sabor agridoce que nos inebria
Loucura é a válvula de escape em meio a tanta “realidade”
O sorriso e a lágrima entre o saudável e o doente
A gargalhada ou o grito que diferem felizes e infelizes
Entre cada ato tido como maluco
Ou em cada inércia tida como sã
Moram a alegria e o prazer de viver
A loucura é o traço sutil a distinguir o certo do errado
Mas é também a linha tênue entre a insanidade e a felicidade…
Loucura responsável é saudável!
Alda M S Santos
LOUCOS E SÃOS
Saiu do ensaio e subiu a rua de volta para casa
Um carro escuro a seguiu, ela correu, gritou
Mas a voz não saía, os pés não se moviam
O carro parou e duas mãos fortes a jogaram lá dentro
Uma sensação de reviver aquele pesadelo passado retornou
Olhou para aquele rosto (des)conhecido que a ameaçava com o olhar
De onde o conhecia, mesmo?-ela refletia.
“Que vai fazer comigo?”- perguntou estranhamente calma, lágrimas rolando
“Não vou te matar, apenas fazer você ser esquecida, sair do meu caminho”
“Mas quem vai para o Hospital de Barbacena não volta”- parecia adivinhar o que ele queria
Ele expressou aquele sorriso malvado
“Isso mesmo, “anjinha”, você não atrapalhará mais a minha vida”
Uma camisa de força parecia frouxa
Mas o aperto vinha de dentro, sufocava
Viu uma foto no painel do carro, dois jovens sorridentes
Sabia que os conhecia, onde estariam?
Será que enlouquecera mesmo?
Estava toda encharcada de suor e lágrimas que escorriam e nem sentia
O carro parou na entrada de um presídio que era “Barbacena”
Foi retirada do carro, levada para dentro, lugar gelado e sombrio
Aquele lugar ela sabia ter visitado antes numa ilha, os doentes ficavam ali de quarentena quando chegavam de Portugal
Ali a receberam com carinho excessivo, estranhou, parecia falso
Nas paredes, leu algo que soou como piada “Deus é Fiel, Jesus Vive”
“Sim”, ela pensou, “certamente vive, mas não nesse lugar”…
Olhou para fora, o carro daquele (des)conhecido que amara fora embora
Uma nova vida “começava”, o peito apertava muito, doía, o ar faltou
Desmaiou…
Alda M S Santos
Ruínas do presídio de Lazareto Ilha Grande(fotos)
QUE TREM DE DOIDO!
“Trem de doido” é algo impressionante, surpreendente, fora do comum
Isso no bom sentido que tomou…
Uma expressão de mineiro,
surgida em Barbacena
Trens de doidos eram chamados os vagões que despejavam centenas de “loucos”,
Ou aqueles que fugiam aos padrões sociais, nos pavilhões do manicômio de Barbacena.
Trem de doido era o transporte que levava aqueles que fugiam ao “normal”,
Assustador, desumano, cruel.
Trem de doido é a capacidade do ser humano de excluir uns aos outros
Trem de doido é o modo como tratavam esses seres segregados
Trem de doido é a ausência de indivíduo, de ser humano, apenas um bloco de pessoas
Eu disse pessoas?
Trem de doido é carregar o peso de terapias de eletrochoque e lobotomia
Trem de doido é a sensação de aperto que fica no peito
Por não poder reverter o curso dessa história (des)humana
Trem de doido é querer voltar no tempo e limpar tanta sujeira
Trem de doido é imaginar Aparícios, Josés, Marias e Marianas
Da nossa família, ou não, chegando nos trens ou nos lombos de cavalos
Apenas um nome num livro gigante e amarelado, data de internação e falecimento
Informações nem sempre confiáveis
Trem de doido é tentar impedir as lágrimas que rolam sem cessar
Trem de doido é ver o quanto estão presos dentro de si, como parte daquele lugar
Trem de doido é sentir que bastaria ser diferente
Para ser ali jogado, esquecido e realmente ensandecer.
Trem de doido é saber quantos “perdidos” dentro de si
Apenas por serem diferentes
Ainda hoje são considerados insanos!
Que trem de doido!
Alda M S Santos
LOUCURAS
Se pudesse, quem escolheria para levar consigo?
Ele, preterido, perguntou a ela antes de partir:
A loucura, a fé ou a liberdade?
O amor- ela respondeu convicta.
Não existe essa opção- retrucou, sempre racional.
Engana-se!
Amor é loucura, fé e liberdade.
Eu escolho o amor!
Ele, em meio a tanta razão, não entendeu,
E partiu…
Alda M S Santos
LOUCURAS?
Quero ser um caracol, fechar-me dentro de mim mesma
Sair apenas quando a luz de fora entrar
Ou a de dentro conseguir iluminar tudo lá fora
Quero brincar de esconde-esconde
Encontrar um esconderijo bem original
E lá ficar até ser encontrada por alguém com a mesma ideia.
Quero inspirar fundo, bem fundo, sufocar-me em coisas boas
E expirar, jogando fora tudo que faz mal
Quero correr, correr muito, sem direção, até esgotar todas as forças e não sentir mais nada.
Quero ser uma bolha de sabão, subir, subir nas árvores, nas nuvens, encantar e desaparecer.
Quero mergulhar, sem máscaras ou snookers, sentir tudo, descobrir tudo
Afogar-me, se preciso for, e renascer.
Loucuras?
Às vezes são necessárias para se manter a sanidade.
Alda M S Santos