DOAÇÕES, PRA QUÊ?
Têm me causado muita angústia certas situações.
Basta dar uma navegada na internet, conversar com amigos, andar por aí…
Mal fiz uma divulgação de pedido de doações para idosos dos asilos, vejo uma notícia de que o Hospital Maternidade Sofia Feldman, público, que atende a milhares de gestantes carentes, está dependendo de doações para não fechar as portas.
E esta é apenas mais uma. Há inúmeros pedidos de doações para as mais variadas coisas: centros de narcóticos e alcoólicos anônimos, creches, asilos, hospitais, famílias sem teto, desamparadas, deficientes, aidéticos, doenças graves, suplementos alimentares, entre outras.
Mais uma “navegada” e a gente vê golpes, desvios de dinheiro, transações ilícitas, “laranjas” e o escambau!
Das duas uma: ou eu ando muito sensível ou esse mundo passou da hora de ser passado a limpo. Penso que as duas coisas.
Dá uma sensação de impotência perceber que por mais que se faça, esse buraco é sem fundo, o fosso não para de crescer.
Todos sabemos que com a quantidade de impostos que pagamos, se eles fossem bem administrados, não desviados, não haveria tanta necessidade de doações.
Por mais que a gente possa ajudar, financeiramente, trabalho voluntário, carinho, afeto, tempo, sempre parece ter mais e mais pessoas precisando.
O risco que se corre é que os corações se endureçam e ninguém se importe mais, não queira mais ajudar ou participar, ou sequer tenha condições de fazê-lo.
A história nos mostra que sempre houve necessidade de compaixão, de solidariedade, de caridade.
O que aumentou de forma gritante foi a corrupção, a safadeza, a hipocrisia e maldade de nossos governantes.
Nosso país possui recursos naturais, financeiros e humanos para ser uma nação de primeiro mundo.
Nosso maior problema são os desumanos que o administram e os humanos que os aceitam, por falta de consciência ou comodismo.
Precisamos atacar essas duas frentes, ou estaremos sempre “chovendo no molhado” e aumentando esse fosso.
Alda M S Santos
DORES NA SIMPLICIDADE E NO LUXO
Numa semana, num lar de idosos de classe baixa, na outra, num núcleo luxuoso para a maturidade.
Ambos com idosos colocados ali para serem cuidados, tratados, terem sua dignidade preservada.
Espaços limpos, pequenos e simples de um, destoam dos espaços amplos, muito bem decorados e bem aproveitados de outro.
Idosos em seus melhores trajes para receberem as visitas.
Um banho e roupas simples e ausência de acessórios de um, roupas e calçados finos, colares, brincos, maquiagem, chapéus, penteados, cabelos bem pintados e unhas bem feitas do outro.
No primeiro, poucas atividades além da rotina diária: refeições, banho, TV, pátio, sono, medicamentos.
No segundo, agenda cheia: leituras, músicas, visitas agendadas, apresentações, artes, convidados de todo tipo.
Mulheres interagem mais. Os homens, ou são galanteadores ou ranzinzas, muito calados, ou quase incapazes.
O que há de semelhante além de serem homens e mulheres idosos entre 70 e 100 anos de idade?
São como crianças! Olhos sem muita vivacidade, mas com brilho úmido, carentes de afeto. Todos eles!
Abraçam-nos e agradecem a nossa atenção e dedicação como algo precioso.
Querem ser tocados, ouvidos, compreendidos. Precisam do nosso tempo.
Cantamos músicas da sua época (com nossas vozes maravilhosas), deixamos a vergonha em casa, dançamos, tentamos ignorar os mais rabugentos, trazê-los para nós. Quase sempre conseguimos.
Em ambos, poucas visitas recebem. Alguns, ninguém os procura.
O mais triste é que, mesmo aqueles cercados de gente, de atividades, de “amigos”, de tarefas, falta-lhes algo.
Recebem amor, mas querem aquele amor especial, aquele amor específico, aquele que grudou na alma e dói a ausência.
Como me disse uma idosa sabiamente, eles têm muitas presenças, mas uma ou duas ausências impedem definitivamente a felicidade.
Concordo com uma senhora trovadora, residente do lar, autora de livros de outrora:
“Saudade, com tanto lugar lá fora, porque você insiste em doer aqui dentro?”
Divirto-os, me divirto e agradeço a cada um deles a oportunidade de me tornar uma pessoa melhor.
Alda M S Santos
MANTENHA DISTÂNCIA PARA SUA SEGURANÇA
Sabe aqueles dias em que estamos dando choque em nós mesmos?
Pois é! Aqueles nos quais deveríamos carregar pendurada no pescoço e nas costas uma placa com a frase de para-choque de caminhão:
“Mantenha distância para sua segurança”.
Estamos impacientes, tristes, inseguros, insatisfeitos, decepcionados, com raiva até!
Ideal que nem saíssemos do quarto para evitar maiores danos ao “patrimônio” próprio e alheio! Risco de curto-circuito! Pane total.
Mas a vida chama! Trabalho, estudo, família, amigos, afazeres diversos.
Felizmente!
Lá fora, mesmo emburrados, escondidos atrás de uns óculos escuros, tentamos acordar.
Devagarzinho, vamos começando a enxergar as coisas belas e boas, que são muitas, e retribuir.
Fazendo o levantamento dos males que nos atingem, deixando todos eles, um a um, pelo caminho.
Com calma, com alma, respeitando nossos próprios limites, dores e lágrimas.
Aceitando os sorrisos, os carinhos, o amor que se apresenta.
Como “diz” outro caminhão:
“Nas curvas da vida, entre devagar…”
Se não quisermos atropelar ou ser atropelados.
Que aproveitemos a paisagem e as companhias.
Boa viagem!
Alda M S Santos
LOBOTOMIA
“Por que a gente fica velha e lembra só de coisas que machucam o peito da gente?” -Perguntou-me uma idosa, lágrimas a escorrer no rosto enrugado, olhos cheios de histórias!
Pessoas jovens também, querida! Precisamos levar a mente a pensar nas coisas boas que todos temos, respondi.
“Mas até coisas boas ferem o coração, porque não existem mais”.
Sei que não é fácil, mas a mente é flexível, precisamos levá-la para bons lugares. Curtir a saudade boa. Interagir com as companheiras, participar mais, digo.
“Quero não, perdi o gosto, estou aqui esperando pra morrer e sozinha. Queria fazer aquela operação que apaga o cérebro da gente, como chama mesmo”.?
Lobotomia?
“Essa mesmo! Aí a gente não sofre, apaga o que dói!”
Eu a abracei e brinquei: gosta de abraço? Não gosta de cantar? Vamos cantar? Se fizer lobotomia irá esquecer os abraços, as músicas!
Ela riu e disse: “vou tentar lembrar do que é bom! Quando você volta?
Quantos de nós não temos vontade de “apagar” em nós o que nos machuca?
O risco é apagar o que há de bom também!
Melhor mesmo é conviver com nossas dores, nossos amores, nossas amizades, nossos atropelos.
E tentar produzir mais sorrisos que lágrimas, equilibrando a balança.
Alda M S Santos
SOMOS RESPONSÁVEIS!
Tinha um homem no meio do caminho
Não um caminho especial,
Ou bonito, arborizado, gramado ou fresquinho
Piso de cimento quente, sob o sol, atrás de veículos,
À vista de todos
Sem ser realmente visto por ninguém!
Não era um ser humano, um alguém
Era um homem qualquer
Jogado num caminho qualquer,
Abandonado por outros seres humanos(?) quaisquer,
Somos responsáveis!
Alda M S Santos