NADANDO CONTRA A CORRENTE
Nadar contra a corrente pode ser trabalhoso, exigir muito, forçar a resistência. Parece ruim. Mas pode ser benéfico.
Nadar a favor da correnteza é deixar-se levar… Se algo nos agrada ou não, concordamos ou discordamos, somos favoráveis ou desfavoráveis, vamos com a corrente, pacíficos ou indiferentes.
Podemos trombar com troncos enormes, afundar, sair levando galhos e folhas grudados, seguir qualquer curso, perder partes pelo caminho, mas vamos com a correnteza.
Nadar contra a corrente é dizer não, parar, voltar quando nos deparamos com um destino que não desejamos, acessórios que dispensamos, obstáculos que gostaríamos de transpor, companhias que nos desagradam, ainda que todos a acompanhem. Podemos afastar quem não gostaríamos, perder partes, esfolar todo, mas manteremos o essencial.
Nadar a favor da correnteza só é válido se não ferir nossa natureza, caso contrário nadaremos contra nossa corrente interna, nossas emoções, nossa alma.
O que é preciso ter em mente é que esse nado vai sempre causar benefícios e danos, contra ou a favor da correnteza. E aqueles que ferem nossa natureza são os mais difíceis de lidar, pois corremos o risco de nos misturarmos demais e não nos identificarmos mais.
Se parecer fácil demais, pode ser que estejamos a favor da correnteza e contra nós mesmos.
Pensemos nisso!
Alda M S Santos
BALANÇOS DA VIDA
Não há quem não se encante com um balanço, uma gangorra. Eles nos remetem à infância, a brincadeiras, sorrisos, amigos, frio na barriga.
Os melhores são aqueles de madeira e corda amarrados numa árvore bem alta num quintal de terra batida. Se não for possível, um de ferro numa praça urbana também é válido.
A cada ir e vir da gangorra a árvore chia, folhas caem, pássaros revoam, a gente geme e gargalha. Por vezes, um amigo empurra.
Vejo nossa vida assim: um grande balanço.
Ora estamos no alto, ora embaixo, outra vez no alto…
Algumas vezes estamos sós, muitas vezes acompanhados. Tantas vezes precisamos de um empurrãozinho amigo para nos manter no ar!
Nisso consiste o viver. Derrubaremos folhas, afastaremos pássaros, faremos nossa árvore chiar, atrairemos amigos querendo brincar, amores para balançar junto, teremos muitos gemidos e gargalhadas, de prazer ou dor.
Só altos ou só baixos não é gangorra. Balanço não foi feito para ficar parado.
Quando a inércia, a letargia ou apatia quiserem de nós se apossar, além de um simples momento de descanso, devemos nos lembrar que balanço bom é o que está em constante movimento.
Portanto, inclinemo-nos para trás, estiquemos as pernas, olhemos para o alto, fechemos os olhos, se preferirmos…
A emoção toda consiste em balançar-se, sorrir, gritar e se entregar!
Alda M S Santos
BOLA PRA FRENTE
A maturidade diminui nossas urgências em algumas coisas. Porém, se algo estiver fora dos eixos, essa urgência só aumenta com a ideia de que o tempo está ficando mais e mais curto…
Algumas coisas queremos para agora, outras para ontem, e há ainda aquelas que para nunca!
Só nós podemos fazer essa escolha!
Escolha feita, agir, curtir e “bola” pra frente, pois o jogo só acaba aos 45′ do segundo tempo.
Alda M S Santos
CAIS
Toda embarcação, grande ou pequena, de carga ou passageiros, de trabalho ou passeio, necessita de cais. Um local em que possa atracar, aportar para carregar ou descarregar mercadorias ou passageiros, abastecer, realizar reparos, ou, simplesmente, descansar entre uma jornada e outra. As embarcações não foram feitas para viver atracadas todo o tempo, precisam sair da costa, enfrentar o mar, buscar novos ventos, cumprir sua jornada. Elas saem mais seguras quando têm o cais para retornar. A certeza de um porto que é seguro e confiável.
Nós somos como as embarcações. Estamos sempre em alto-mar: nossa vida, nossa jornada. Podemos, muitas vezes, navegar tranquilamente, baixar as velas, lançar âncora, relaxar. Porém, vezes sem conta enfrentaremos tempestades, ventos contrários, o breu da noite, icebergs, maremotos. Nessas horas, precisamos de nosso cais. Mas, e se ele estiver inacessível, distante, danificado ou ocupado? Perdemos o norte, navegamos sem rumo, arriscamos a causar danos à própria estrutura ou perda de carga.
Visando a auto-preservação, necessário é que tenhamos vários cais. Não podemos apostar todas as nossas fichas num único dado. Se tivermos um cais em cada porto, em qualquer lugar que estivermos, sejam quais forem os danos sofridos, teremos o conforto do cais para atracar.
Há pessoas que dizem “não vivo sem fulano, ele é minha vida”! Isso é ter um único cais. Além do risco de sobrecarga do cais, pode-se perdê-lo por um motivo qualquer alheio à nossa vontade. Aí, estaremos à deriva!
Não estou pregando a autossuficiência. Nós, seres humanos, nunca o seremos. Como seres gregários, precisamos uns dos outros, todo o tempo, uns mais, outros menos. O que acredito, e em que aposto, é que precisamos, além de ser cais para os outros, buscarmos vários cais para nós mesmos. Não é preciso tantos. Qualidade aqui vale mais que quantidade. Alguns cais são óbvios: familiares, cônjuges, alguns amigos. Há ainda aqueles cais que abandonamos, nos esquecemos e que, numa hora de sufoco, nos atracamos nele e percebemos que nunca deveríamos tê-lo relegado. Dependendo de onde estivermos, do que estejamos precisando, escolhemos o cais mais adequado. O que possibilita um descanso, uma vista maravilhosa, uma palavra sábia, um ombro para chorar, uma recarga de energia, uma descarga de maus fluidos, enfim, para cada necessidade, um cais diferente.
Ter vários cais nos dá mais segurança, a quase certeza de que não estaremos sós. Quase! A qualquer hora o cais que acreditávamos possuir pode falhar, não estar disponível ou danificado. Nossa mãe, cais mais confiável, pode adoecer ou falecer, o cônjuge, pode não ser o mais indicado no momento, os amigos, estarem ocupados demais…
Muitas vezes, só poderemos contar com dois deles: nós mesmos e Deus. Teremos que saber acioná-los. Deus estará sempre a postos e nos indicará a nós mesmos. Precisamos ativar nossas reservas, necessitamos de autoabastecimento, de um gerador próprio de energia até encontrarmos outro cais.
Sempre teremos o cais preferido, aquele em cuja presença sorrimos, e cuja falta nos leva às lágrimas. Aquele no qual nos encaixamos perfeitamente, que supre nossas necessidades maravilhosamente, nos enriquece, abastece, dá brilho, renova as forças. Nunca devemos abandoná-lo, mas é preciso não esquecer que ele também é falível.
Finalmente, se um cais nos mantiver atracados por tempo demais há algo de errado com ele ou conosco. Não devemos nos esquecer que nossa essência é de navegantes.
Vamos recolher âncoras, içar velas, que mais uma jornada vai começar. Que tenhamos um mar mais calmo e vários portos com cais mais seguros. É o que precisamos, é o que desejamos!
Alda M S Santos
Observando o corre-corre da vida diária, seja na rua, na família, no trabalho, nos jornais ou na TV, ninguém seria capaz de negar o quanto as desigualdades são inúmeras. Vemos pessoas diferentes: altas, baixas, gordas, magras, brancas ou negras, entre outras. Possuem em comum o fato de serem seres humanos. Isso deveria, a princípio, dar a elas as mesmas condições de evolução física, psicológica, espiritual ou material. Na prática não é o que acontece. O que determina que algumas pessoas tenham mais habilidades, dons e capacidade de conquistas que outras? Veio em seu DNA? Recebeu de Deus? Foi desenvolvido?
Se veio no DNA, não escolhemos. Se recebemos de Deus, qual seria o critério por Ele utilizado para fazer tal distribuição, considerando-O um Deus de amor? Se é desenvolvido pelas pessoas, seria a partir de que base?
Sabemos que, via de regra, as pessoas com saúde física e mental, espiritualizadas e com algumas conquistas emocionais e materiais são mais felizes. Enfrentam com mais recursos as adversidades que se apresentam. Delas poderia ser “cobrada” uma atitude mais positiva perante a vida.
Mas, e aquelas que desde o nascimento já são acometidas pelos problemas: miséria física, material, emocional, espiritual? Vêm de um lar onde reina a pobreza extrema, em todos os aspectos da vida humana? Falta-lhes alimento para o corpo e para a alma. Seria justo que se cobrasse delas, com o mesmo rigor, a mesma evolução das demais?
Há aqueles que acreditam que somos um mesmo espírito vivendo em vários corpos, várias vidas, e que estaríamos, de acordo com a evolução de cada um, resgatando dívidas passadas, daí viriam as diferenças. Cada religião explicaria de uma forma diferente as desigualdades. Certo é que quem professa uma fé, conforma-se melhor com a própria situação e é até feliz.
Religiões à parte, o que temos pra lidar são as desigualdades que batem às nossas portas, invadem nossas casas, corpos e mentes de todas as maneiras. Independente de qual seja a causa das diferenças, podemos minimizá-las. Seja qual for a situação em que nos encontremos, sempre haverá alguém melhor ou pior que nós, que tem mais ou que tem menos, que pode mais ou que pode menos.
Cabe a nós, então, manter os olhos em trânsito: lá na frente, para crescermos sempre, lá atrás, para oferecer a mão a quem tem menos.
Se a humanidade que nos faz uma espécie única não for o bastante para ajudar, usando de tudo que possuímos, material, mental ou espiritual, que independente de religião, possamos nos lembrar que: ” A quem muito foi dado, muito será exigido; e a quem muito foi confiado, muito mais será pedido”.(Lucas, 12-48)
Que possamos crescer em nossa humanidade, sempre.
Alda M S Santos
Basta sair de casa e rodar poucos quilômetros para no primeiro semáforo observá-los. O sinal fecha, os carros param, e eles vêm correndo. Colocam no retrovisor do carro uma tira de 5 paçocas. “Vai uma paçoquinha aí, moça? Só R$2,50.” O olhar tímido, às vezes desafiador. Não passa de oito anos. Pequeno, magro, expressão sofrida para uma criança. Em poucos segundos volta rapidamente recolhendo o dinheiro da venda, ou as paçocas, e sai correndo antes que o sinal abra.
Pouco à frente, no próximo semáforo, tempo mais longo, vem um senhor lentamente. Pipocas e garrafas d’água nas mãos. Cabeça branca, andar arrastado, não sei precisar a idade, talvez 70, semblante sério, carregado. Chega e oferece seus produtos. Sorri ao ouvir as músicas da década de 70 que ouço. O olhar carrega-se de saudade. “Bons tempos”, ele diz. Concordo e completo, “está sempre aqui”. “Sim, desde que me aposentei, pouco dinheiro, filhos desempregados, família grande, netos. É preciso ajudar.” Despede-se e vai pro próximo carro.
Sigo meu caminho para o trabalho ouvindo minhas músicas e refletindo. Que mundo é esse em que crianças que deveriam estar na escola ou jogando bola na rua estão vendendo paçocas no sinal? Que mundo é esse em que um senhor de 70 anos, aposentado que já fez tanto pela sociedade, que poderia estar lendo para os netos, brincando de cavalinho, curtindo um sítio, ainda se dispõe a ser ambulante de semáforos nas ruas quentes e barulhentas?
Que futuro estamos promovendo para nossas crianças? Que descanso estamos permitindo aos nossos velhos? Ao olharmos esses dois extremos devemos cuidar para o desânimo não tomar conta de nós. O senhor da pipoca pode ter sido um garoto da paçoca! Há alternativas? O que podemos fazer para que ao menos o garoto da paçoca torne-se, daqui a alguns anos, o senhor que estará lendo para os netos, brincando de cavalinho e cultivando flores num sítio?
Decido-me a continuar fazendo com amor e dedicação a parte que me cabe. A educação ainda é o melhor caminho, nossa melhor chance. Assim, vou ainda mais animada receber meus pequenos alunos. E que Deus nos abençoe!
Alda M S Santos
Setembro Amarelo: quantos indivíduos sabem o que isso quer dizer?
Temos visto divulgados na mídia casos de suicídio que nos alarmam e impressionam. Pais de família que matam esposa e filhos e se matam em seguida, jovens que têm “tudo” e, do nada, tiram a própria vida. Tantas vezes, para nós “normais”, por motivos banais. Os dados são alarmantes. Apenas no Brasil são 32 suicídios por dia, segundo dados do CVV(Centro de Valorização da Vida). Mais que mortes por câncer ou Aids.
A morte por suicídio tem sido estigmatizada, como foram as mortes por sífilis e Aids. Evita-se falar do assunto. Considera-se fraqueza moral, não doença.
O Setembro Amarelo vem como uma campanha de alerta para salvar as pessoas dessa morte anunciada.
Ninguém se mata de uma hora para a outra. Essa ideia vem germinando na mente dos indivíduos, crescendo, sendo alimentada, amadurecendo por uns tempos. Podemos ter ao nosso lado, todos os dias, uma bomba relógio, prestes a explodir, e sequer percebermos.
Num mundo em que parece que temos tudo à mão, acesso às informações, educação, lazer, saúde, recursos materiais, físicos, tecnológicos e terapêuticos, nos falta o principal: o recurso humano.
Com tantas facilidades conquistadas seria de se esperar que a vida fosse mais valorizada. Mas o tiro tem saído pela culatra. Conquistar e manter certos bens e direitos tem criado dois grandes problemas. Primeiro, é um terreno propício para germinar muitas doenças mentais que levam ao suicídio, como depressão, bipolaridade e dependências químicas. Segundo, cria seres alienados, com viseiras, que olham só para frente e não veem o olhar do ser humano ao seu lado que grita por socorro. Quando vê, ignora, não quer se envolver, não tem tempo, paciência ou habilidade, ou ainda reclama: ” fulano só anda emburrado e de mau humor”. São exatamente esses que ficam mais abismados com tantos casos de suicídio.
O Setembro Amarelo vem pra cutucar mesmo, provocar, induzir os doentes a buscar ajuda e os saudáveis a oferecê-la. Sem pretensão de querer prever o futuro, uma hora podemos ajudar, noutra podemos precisar de ajuda. Precisamos aprender a identificá-los e ajudá-los.
Vamos preservar a vida: a nossa, a dos outros.
Alda M S Santos
A palavra saudade é tão forte que só de ouvi-la já podemos sentir aquele aperto característico no peito. Às vezes, esse aperto pode ser doloroso, outras prazeroso, sempre nostálgico.
Mas será que a saudade é um sentimento benéfico ou contraproducente?
Penso que a saudade é sempre uma sensação de ausência, de falta. O que fará com que seja benéfica, ou não, será a capacidade que relembrar venha a ter de amenizar esse vazio, ou aumentá-lo.
Podemos sentir saudades da casa da infância, dos irmãos e amigos da escola, de um animal de estimação, das brincadeiras na rua, de um parente que faleceu, das loucuras do primeiro amor, do primeiro beijo roubado, dos bate-papos na calçada até a madrugada, dos bailes da juventude, dos apertos da faculdade, do casamento, do nascimento dos filhos, de um sentimento que morreu ou adormeceu… São inúmeras as vivências que podem gerar saudades.
As que conseguem gerar um sentimento de completude, de preenchimento do vazio, são aquelas nas quais nos envolvemos a fundo, em que não há arrependimentos, pois, em sua época, foram vivenciadas plenamente, ficaram para trás, mas geram lembranças boas, gostosas de reviver. Essa saudade é extremamente benéfica. Faz-nos rever bons tempos e nos anima a seguir em frente. Gera forças.
Em contrapartida, há aquelas situações cujas lembranças não preenchem o vazio deixado. Reviver dói sempre, porque, em sua época, o viver, apesar de intenso, foi doloroso. Foi incompleto, não vivenciado como gostaríamos, deixou espaços em branco, arrependimentos, vácuos. Portanto, ao reviver, não se lembra apenas do que foi bom, mas do que poderia ter sido e não foi. Fica sempre a pergunta “por que não agi assim?”, “teria sido tão diferente se eu tivesse feito outra escolha!” Ao viver essa saudade sempre ficamos incompletos, com vontade de voltar no tempo e consertar certas coisas: estudos, empregos, amizades, amores. Fica, para muitos, um gosto amargo na boca, com a sensação de ter sido preterido pela vida.
Essa saudade, que não gera preenchimento, tende a ser maléfica, porque nos paralisa, nos deixa inertes, impotentes, visto que não temos como voltar no tempo e reviver o que ficou faltando, o que nos causa dor.
Os mais velhos tendem a sentir mais saudades, é natural, já tiveram mais experiências. São mais nostálgicos, mas não precisam ser tristes.
De todo modo, se viver de saudades, por tempo demasiado, nos impedir de viver o tempo presente, seja qual tipo de saudade for, não será bom a médio e longo prazo.
Todos nós temos momentos maravilhosos para sentir saudades e relembrar, e outros que preferiríamos corrigir, consertar, ter outra oportunidade. Alguns talvez possamos fazer isso. A maioria, não. Na impossibilidade, quando essa saudade bater, aproveitemos para analisá-la, avaliar nosso comportamento, e usar desse conhecimento, dessa experiência, para sermos mais plenos em nossas vivências atuais. Aprendemos, por experiência própria, que as saudades mais dolorosas são daquilo que deixamos por fazer. Com isso em mente, poderemos viver mais plenamente e deixar para o futuro menos saudades dolorosas e mais razōes para saudades benéficas, prazerosas, intensas!
Alda M S Santos